Edição: 473 | Texto por: João Nuno Frazão
O Espaço, outrora um domínio predominantemente científico, transcendeu para uma fronteira estratégica crucial, essencial para a sociedade e a defesa nacional, e está a tornar-se rapidamente o próximo campo de batalha. Esta evolução exige novas considerações políticas, estratégicas e jurídico-normativas no âmbito da Defesa Nacional de Portugal.
• Política e Estratégia Inicial: Portugal, reconhecendo a importância crescente do Espaço, deu passos significativos, como a criação do "Grupo de Projeto Space Surveillance and Tracking" em 2017 e a adoção da "Estratégia Portugal Espaço 2030" em 2018.
. Para a vertente da Defesa, o governo português anunciou em outubro de 2021 a "Estratégia da Defesa Nacional para o Espaço 2020-2030" (EDNE). Esta estratégia foi pioneira ao definir o Espaço como um domínio operacional separado no universo das atividades de defesa nacional, a par da terra, mar, ar e ciberespaço. A EDNE preconizou a edificação de capacidade militar espacial de forma integrada, com a concentração do comando e controlo e das funções operacionais de nível estratégico e operacional no Estado-Maior-General das Forças Armadas (EMGFA). A reorganização das Forças Armadas, operada entre 2021 e 2023 através de novos diplomas legais (como a LOEMGFA e LOBOFA), aditou a competência do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA) para "assegurar os aspetos militares do programa espacial da defesa nacional". Foi também criado o Centro de Comunicações e Informação, Ciberespaço e Espaço (CCICE) no EMGFA, com um Departamento do Espaço para dirigir a edificação de capacidades militares conjuntas.
• A Realidade Operacional e o Ajuste Jurídico-Normativo Necessário: Apesar das opções políticas da EDNE parecerem centralizar a capacidade espacial no EMGFA, a análise detalhada do quadro legal revela uma nuance fundamental: o EMGFA não concentra a totalidade da capacidade operacional espacial, nem esvazia, limita ou prejudica as competências dos ramos, em particular as da Força Aérea Portuguesa (FAP). É crucial sublinhar que o "know-how" e o desenvolvimento de capacidades operacionais efetivamente se encontram nos ramos e não primariamente no EMGFA. A FAP, por sua vez, alinhou-se com a evolução do domínio ao adotar, em março de 2022, a sua "Diretiva Estratégica 2022-2025", que prevê a integração do Espaço e do ciberespaço nas suas capacidades operacionais. O artigo argumenta que a FAP é, de longe, a entidade mais apta para responder ao desafio da crescente militarização do espaço exterior, dada a sua missão principal na defesa militar da República, o seu papel na defesa aérea e no policiamento do espaço nacional, e o exercício da autoridade do Estado no Espaço Estratégico de Interesse Nacional Permanente (EEINP). A implementação do Centro de Operações Espaciais (COE) no Comando Aéreo da FAP, com inauguração prevista para 24 de setembro de 2024, materializa esta visão operacional. Esta integração do domínio do Espaço nas capacidades operacionais da FAP é vista como um complemento ativo e construtivo às competências do EMGFA, preenchendo as lacunas de capacidade operacional no domínio do Espaço. O contexto geopolítico atual, com a guerra na Ucrânia e uma crescente urgência em reforçar a Defesa europeia, exige que Portugal pense e encare o Espaço como uma prioridade real da Defesa Nacional. Assim, o artigo sugere que é forçoso reponderar as competências da Força Aérea no plano jurídico-normativo, nomeadamente através da revisão da Lei n.º 28/2013 que estabelece as competências da Autoridade Aeronáutica Nacional (AAN), inerente ao Chefe do Estado-Maior da Força Aérea. Esta revisão permitiria expandir as competências da AAN para incluir atividades espaciais, aproveitando os meios logísticos e operacionais já existentes na Força Aérea e clarificando deveres e obrigações, especialmente para entidades privadas que operam satélites de dupla utilização (civil e defesa).
AForça Aérea está a trabalhar ativamente para refinar e expandir a sua própria estrutura jurídica e operacional, garantindo que o seu papel no domínio espacial seja tão robusto e claro quanto o seu domínio nos céus.
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